terça-feira, 6 de março de 2007

O Nariz


Imagine que você acorda em um dia de março, na sua casa, e vai para a cozinha tomar o café da manhã. Imagine também que você está preparado para comer uma bela fatia de pão. Pega a faca, sal, cebolas e põe-se a preparar o alimento ao seu gosto. Agora, imagine que, ao dividir o pão, você avista um elemento estranho, não pertencente àquela mistura de farinha, água, ovos e fermento. Com curiosidade, você coloca o dedo no miolo (do pão, é bom deixar claro) e tira ali de dentro nada mais nada menos do que... Um nariz!
Assim começa o fantástico conto do ucraniano Nicolai Gogol. Escrito no século XIX (entre 1835 e 1836) por volta da mesma época em que foi escrito Pinóquio, de Carlo Collodi, a "saliência cuja forma se assemelha a pirâmide de base triangular, situada na parte média do rosto, acima da boca e abaixo da testa, e com funções olfativa e respiratória" estava em alta naquele período.
Em " O Nariz", é narrada (em terceira pessoa) a odisséia de Ivan Iacovlievitch, morador da rua Voskressienskaia, em busca do infeliz dono do nariz encontrado no pão assado por sua esposa, Prascóvia Ossipóvna. O pavor de Ivan aumenta quando ele reconhece que o nariz em questão pertence ao inspetor-geral Kovaliov.
Gogol foi um dos responsáveis pela afirmação do realismo mágico-fantástico da literatura russa do século XIX, e também pelas descrições satíricas e cômicas, que ironizavam a Rússia burocrata e corrupta da época.
Gogol serviu de inspiração não apenas no território da literatura (tal como o japonês Ryunosuke Akutagawa, que escreveu o conto Nariz, numa alusão clara `a obra de Gogol), mas também no território da música -o compositor Dmitri Shostakovich compôs uma ópera com o mesmo nome do conto.
O conto pode ser encontrado no livro Os 100 Melhores Contos de Humor da Literatura Universal, organizado por Flávio Moreira da Costa. É o conto número trinta do livro (p.163-182). Uma leitura nada convencional de um escritor criativo e surpreendente.

segunda-feira, 5 de março de 2007

Admirável Mundo Novo


Admirável é pouco! Aldous Huxley compõe um quadro futurístico caótico, artificial, alienante, despótico e científico. Juntamente com os livros Laranja Mecânica (Anthony Burgess) e 1984 ( Geroge Orwell), Admirável Mundo Novo "é um dos ícones literários da alienação pós-industrial que caracterizou o século XX" (nota do livro Laranja Mecânica da editora Aleph, e publicada na orelha da capa).
632 d.F. Londres. Os prédios cinzas, os laboratórios de pesquisa, as pessoas "nascendo" de tubos de ensaio. O soma é uma droga sintética, ingerida por toda a população. Todos são artificialmente felizes. Não há pai, nem mãe (inclusive sendo essas palavras profanas!), e não há Deus. Há um deus, chamado Ford. Não há reflexão, contestação, a poligamia é incentivada e cultivada desde os primeiros anos. A sociedade dividida em Ípsilons, Alfas e Deltas, como perfeitas castas. Toda a noite as crianças escutam uma voz que diz "Cada um pertence a todos", entre outras centenas de frases condicionantes. Já nascem sabendo o que são, para que servem e como são - e o que nunca chegarão a ser. Essa estrutura perfeita e montada com tanto cuidado é balançada com a chegada de John, o "Selvagem". John é filho. Tem pai e mãe. Estava isolado em uma ilha, até que Bernard, visitando a reserva do Novo México (lugar onde habitam os últimos exemplares de selvagens, filhos de pais e mães, afastados do progresso científico) o encontra e o leva para Londres. Na cidade, John se sente confuso com o que vê. E os que o vêem sentem-se, também, confusos. John recita Shakespeare, e ninguém o entende ( ele está entre os autores proibidos pelo governo, por Vossa Fordeza). John mostra sua mãe, e ninguém compreende sua feiúra, sua sujeira, e, menos ainda, a dor de John de perdê-la. O amor não tem espaço nessa sociedade tecnicista e científica.
Escrito em 1932, Admirável Mundo Novo é o tipo de obra que deixa um gosto ruim na boca. O soma, por exemplo, parece-se muito com o ecstasy. A criação massiva em tubos de ensaio parece-se muito com os processos de clonagem. Os prédios cinzas e altos podem ser vistos nas cidades atuais, elevando-se em concreto e cinza. As diferenças de classes - bem, é só olhar ao nosso redor. A indiferença, o preconceito, a ambição, são sentimentos cada vez mais próximos na vida real. A falta de reflexão, de senso crítico, a desvalorização do ser humano, são aparentes na nossa sociedade atual. O que mais assusta ao ler Admirável Mundo Novo não é a ficção. É a sua extrema familiaridade com o mundo real.

Um livro com uma linguagem interessante, muito bem escrito e de temática terrivelmente familiar.
Uma dica para quem quiser comprar o livro: o da editora Globo, da série A Aventura de Ler, foi publicado em papel-jornal - o que favorece muito na hora de pagar pela obra. A média de preço desse livro é de quinze reais, contra os quarenta ou cinqüenta de uma obra impressa em papel branco.
Admirável Mundo Novo (Brave New World)
Aldous Huxley
1932
318 p (versão editora Globo)
Tradução Lino Vallandro e Vidal Serrano

O Mágico de Oz - O Livro


"-Os sapatos prateados-disse a Bruxa Boa - têm poderes maravilhosos. E uma das coisas mais curiosas a respeito deles é que podem levá-la a qualquer ligar do mundo em três etapas; e cada etapa transcorre em um piscar de olhos. Tudo o que você tem de fazer é bater os calcanhares três vezes e mandar os sapatos levarem-na aonde quer que desejar ir. " (p. 166 - O Mágico de Oz)
Publicado em 190o nos Estados Unidos, o livro de autoria de L. Frank Baum foi o primeiro grande sucesso destinado ao público infantil. Em três meses, vendeu cem mil cópias da obra - somente no país do tio Sam.
É conhecida a história da menina Dorothy Gale que, juntamente com seu cão Totó, é levada por um ciclone de sua terra natal (estado do Kansas) até a terra dos Munchkins. Para conseguir retornar para casa, é preciso chegar na cidade das Esmeraldas para que o Grande Mágico de Oz realize o seu desejo. Enquanto segue pela estrada de Tijolos Amarelos, ela encontra três diferentes seres que, como ela, também têm desejos para serem realizados. Assim, Dorothy é acompanhada do Leão Covarde, do Lenhador de Lata e do Espantalho sem cérebro. Durante a jornada, enfrentam perigos e aventuras até alcançarem seu objetivo.
Chama a atenção a escrita sucinta de Baum. Apesar de ser um livro descritivo, cabe muito mais ao leitor montar certos detalhes da estória, possível de serem vistas na versão cinematográfica do Mágico. Os famosos sapatinhos de Dorothy, que, no livro, são descritos como prateados, no filme de 1939 são transformados em sapatinhos de Rubi (já que a era dos filmes em cores estava começando, acreditou-se ser melhor destacar a cor dos sapatinhos, sendo que, por esse motivo, eles se tornaram de cor escarlate). Outro detalhe do livro modificado no filme é o uso do machado do Lenhador de Lata. No decorrer do livro, o lenhador decapita, com sua ferramenta, desde gatos à plantas venenosas. Já no filme as mortes são mais atenuadas, mais disfarçadas.
A famosa frase "Não há lugar como o lar" só ocorre no filme. No livro, basta bater o calcanhar três vezes e dizer o nome do lugar para onde você deseja ir. Diferenças à parte, ambos possuem um encanto, e despertam a curiosidade sobre Oz e seus personagens.
Uma das lendas sobre o Mágico viria a aparecer muitos anos depois - na verdade, quase cem anos após a publicação da obra. Em 1997, fãs do grupo britânico Pink Floyd descobriram que, se colocado juntamente com o filme do Mágico de Oz, o álbum Dark Side of the Moon seria a trilha sonora perfeita. Um exemplo seria a música Money, que coincide com a caminhada de Dorothy pela estrada de tijolos amarelos (de ouro). De acordo com os fãs da banda, há mais de cem coincidências entre o filme e as músicas do álbum. Para essa "coincidência" toda, os fãs deram o nome de Dark Side of the Rainbow (algo como "o lado sombrio do arco-íris"). A banda nega o planejamento dessa sincronicidade; planejado ou casual, o fato é que não há lugar como Oz...